Ficou sim, em tudo um pouco. Ainda que breve passagem, algo
foi retirado e deixado para trás, além das lembranças. Segundos, minutos,
horas, dias, semanas, meses, anos, tempo que pertencia ao meu ciclo de vida,
compartilhado, dividido, oferecido e, muitas vezes, tomado, mas nunca inútil.
Entre bons e maus momentos, alegres e tristes, falsos e
verdadeiros, com ou sem armadilhas, seguimos, sem nada por arrepender, nada a
temer, sem mágoas ou ressentimentos. O que foi, foi! Deixados para trás ficaram
no vão livre das experiências, um vão imenso, que sempre tem lugar para novas e
para outras.
Muitas vezes brilharam meus olhos, mas também percebi o
brilho de outros olhos e, quando isso acontecia, era meu coração que brilhava,
entusiasmado pela visão da conquista, por mínima que fosse. Deixei para muita
gente, uma palavra, um incentivo, uma crítica, um conselho, certas ou erradas,
minhas convicções, minha justiça, minha lealdade, nunca a indiferença.
Estive por baixo, estive por cima, nos mais diversos
segmentos e a isso dei pouca importância, só importava estar e cumprir o
objetivo de ser eu mesmo, em qualquer circunstância. Fui aprovado em concursos
externos e internos, abri e fechei empresas próprias, fui preterido muitas
vezes, sem ver abalada a confiança e o empenho de fazer melhor, independente
dos acontecimentos.
Essa postura me livrou de úlceras, mas não me poupou de
elogios e críticas. Novamente, fui eu mesmo, não permiti dos elogios a soberba
e, muito menos das críticas, o desânimo. Só prossegui, naturalmente, com a
mesma fé e o interesse de ser, cada vez mais, comprometido com os ideais que
foram brotando durante o percurso.
Errei muito, acertei muito, aprendi muito. Fui muito em
tudo, por mim e por outros. Não fugi de nenhuma batalha, embora nem sempre
tenha conquistado o pódio, lutei por ele, com afinco. O empenho esteve lá, em
todos os embates, conquistando amigos e inimigos também, que me respeitavam,
por não tripudiar sobre eles.
Disso me veio a permissão poética de, ao não ser omisso,
acreditar que pedaços de mim ficaram pelo caminho. Não matéria, mas a energia
em forma de exemplos, gratidão, reconhecimento, honestidade, honra, caráter,
força de vontade, posturas éticas, essas coisas que, por mais que sejam
renegadas, jamais estiveram ultrapassadas e continuam a surpreender e ser desejadas.
A contribuição dada no passado, como assinatura ou
identificação daquilo que fui, minha marca registrada, é também a passagem adquirida
para o futuro, enquanto ele chegar. Não se repetirão as ações, cenários serão
outros, novas situações, diferentes pessoas, sentimentos diversos, mas os
elementos permanecerão os mesmos, necessariamente, imutáveis, como sempre.
Texto do livro "Pensar para sair do lugar"